A repercussão do Roda Viva no Twitter – Jair Bolsonaro
Acompanhamos na segunda-feira passada, dia 30 de julho, as manifestações no Twitter ligadas ao programa Roda Viva, que contou com a participação de Jair Bolsonaro, pré-candidato à Presidência da República pelo Partido Social Liberal (PSL). O programa obteve sua segunda maior audiência neste ano, perdendo apenas para a entrevista com o juiz Sérgio Moro. Esta é a segunda análise que publicamos – na semana passada, analisamos a repercussão no Twitter do Roda Viva com Geraldo Alckmin.
Números gerais e Bolsonaro vs. Alckmin
Foram utilizadas diferentes hashtags e expressões para se referir ao programa; a principal delas, #BolsonaroNoRodaViva, apareceu em 111.241 tuítes e teve um pico de 2.675 às 23h08. Vale apontar que não houve uma hashtag semelhante no programa de Geraldo Alckmin, e que a busca com seu nome durante aquele programa retornou apenas 10.076 tuítes (um total de 11.627 com a hashtag #rodaviva).
É um dado importante, tendo em vista que estimativas são que o tempo de exposição de Alckmin na televisão no primeiro turno será 22 vezes maior que a de Bolsonaro.
Assuntos-tendência, de acordo com o Twitter: Bozo, Marcos Pontes, Jesus Cristo
#RodaViva foi o primeiro trending topic no Twitter Brasil durante todo o programa, e chegou a ser trending topic mundial (às 23h30). Em diversos momentos, foram também trending topics a expressão Jair Bolsonaro e a palavra Bozo, que estava sendo utilizada de forma jocosa por críticos do candidato, que o comparavam ao palhaço. A primeira referência a Bozonaro que encontramos foi uma camiseta lançada pela marca Cavalera com a piada, em junho deste ano. “Bozo” apareceu em 2570 tuítes durante o programa.
Durante uma boa parte do programa, também foi trending a expressão Marcos Pontes, o astronauta brasileiro que Jair Bolsonaro afirmou que poderia ser seu Ministro de Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações (ou participaria de seu governo de alguma outra forma), aproximadamente às 23h09. O gráfico abaixo mostra que o termo “Marcos Pontes” surgiu em alta às 23h12 no Twitter, chegando a 146 tuítes em um minuto.
Ao fim do programa, quando o jornalista Bernardo Mello Franco perguntou a Jair Bolsonaro sobre sua posição a respeito de refugiados e afirmou que Jesus Cristo era um refugiado, a expressão Jesus Cristo rapidamente escalou uma posição alta nos trending topics brasileiros.
Palavras mais mobilizadas: jornalista, negro, cota
A nuvem de tags abaixo mostra os termos que mais apareceram durante o programa em tuítes que mencionaram a hashtag #bolsonaronoRodaViva. Os termos “Flaviomorgen”, “Pergunta”, “Negro”, “Candidato”, “Jornalista”, “Voto Impresso” e “Brasil” foram empregados com grande frequência.
O termo “Jornalista” foi amplamente utilizado durante o programa, o que pode estar ligado às muitas críticas feitas aos entrevistadores, de todos os lados: usuários de perfil mais conservador e mais progressista ficaram insatisfeitos com as perguntas feitas ao candidato. O perfil @flaviomorgen – identificado em nossa nuvem de palavras acima -, com cerca de 83 mil seguidores, questionou fortemente os jornalistas em sua conta por meio de tuítes e retuítes que obtiveram grande repercussão. Entretanto, é importante ressaltar que o termo “jornalista” também apareceu em tuítes sobre Vladimir Herzog, jornalista torturado e morto em 1975, morte cuja investigação, reaberta ontem pelo Ministério Público, foi discutida no programa. Além disso, muitos tuítes apenas citam os jornalistas convidados, não necessariamente contendo críticas aos entrevistadores.
Os picos de menções a alguns desses assuntos-tendências estão diretamente relacionados aos momentos em que surgiram no programa. O gráfico abaixo mostra a utilização no Twitter dos termos “ustra”, “marcos pontes”, “cotas”, “herzog”, “ipiranga” e “cunha” antes, durante e depois da exibição do programa.
Debate sobre Bolsonaro: extrema polarização
A visualização da rede de retuítes mostra que o debate com a palavra “Bolsonaro” (muito mais tuítes que apenas a hashtag #BolsonaronoRodaViva) foi extremamente polarizado. A imagem abaixo mostra os tuítes mais compartilhados: cada ponto em destaque é uma conta que publicou um ou mais tuítes que foram amplamente retuitados, enquanto cada ligação entre os pontos indica um retuíte. No momento em que um usuário retuita tuítes de contas diferentes, essas contas ficam mais próximas no grafo. A partir disso, contas que possuem “afinidade” entre si (na medida que são retuitadas por usuários em comum) aproximam-se no grafo.
No cluster roxo estão contas que publicaram tuítes apoiadores que geraram 20.431 retuítes; o colorido à direita é composto por tuítes críticos que geraram 21.609 retuítes; o cluster do meio é constituído por um tuíte retuitado por apoiadores e críticos (2.180 retuítes).
O cluster apoiador ficou bastante concentrado em uns poucos tuítes (e perfis: @flaviomorgen, @ro_moller, @fabi_moller e @joelalexandreM), e corresponde a 32,77%.
O cluster crítico é maior e mais diversificado, correspondendo a 35,1% do total; os perfis mais mobilizadores foram @davidmirandario, @calubarros, @LannesDelRey, @dIlmabr (o Dilma Bolada, não o oficial), @pecesiqueira, @aeciodepapelao, @J_LIVRES, @GeorgMarques.
No meio, um tuíte foi responsável por 3,55% dos retuítes (https://twitter.com/MauMeirelles/status/1024117519706148864?ref_src=twsrc%5Etfw).
Os 17.819 retuítes restantes (que correspondem a 28,58%) estão ligados a tuítes que não se engajaram com as contas identificadas no grapho, tendo pouca repercussão no Twitter – e, assim, não foram incorporados em nenhum dos clusters.
A rede de retuítes sobre Bolsonaro durante o programa indica uma polarização muito maior que a verificada no Roda Vida com Geraldo Alckmin, na semana passada (grapho abaixo):
Negro, escravidão, dívida e cota
O termo “Negro” – e, em menor incidência, “Escravidão” e “Cota” – também foi bastante empregado. Aproximadamente às 22h45, Bolsonaro tratou do tema das cotas, afirmando que tal política “divide a sociedade”. Ao ser questionado sobre a dívida histórica da escravidão, o candidato respondeu que não escravizou ninguém, que “o português não pisava na África”, e que essa dívida não existe. Às 22h47 , o monitoramento revelou a súbita expansão do termo “cota”, o qual alcançou a marca de 307 tuítes por minuto.
O grapho abaixo mostra a rede de retuítes em torno do termo “cota”. O maior ponto refere-se ao tuíte de Felipe Moura (@BlogDoPim), jornalista d’O Antagonista e da Jovem Pan, que criticou a defesa de cotas raciais pelos jornalistas. Mario Vitor (@mvitorodrigues), colunista da IstoÉ, criticou a predominância do tema, alegando que isso é “fazer o jogo do candidato”. As postagens do lado esquerdo são críticas a Bolsonaro: a conta @bchartsnet foi suspensa, mas George Marques (@georgmarques) afirmou que o pré-candidato não conhece história do Brasil. A postagem do @blogdonoblat, mais ao centro, apenas reportou que Bolsonaro afirmou que reduziria políticas de cotas.
Outros personagens no debate: Lula, e o coronel Ustra
Foram feitas proporcionalmente menos menções a Lula, durante o debate, que durante o debate de Geraldo Alckmin. Do total de tuítes contendo a palavra Alckmin em sua entrevista, 3,2% continham a palavra Lula; do total de tuítes contendo a palavra Bolsonaro no programa de ontem, 1,8% continham a mesma palavra.
O gráfico abaixo exibe a utilização do termo “Ustra” antes, depois e durante a transmissão do programa. O termo passa por uma pequena expansão quando, aproximadamente às 22h19, Bolsonaro respondeu a pergunta sobre Carlos Alberto Brilhante Ustra, coronel do exército que foi chefe do DOI-Codi, alegando que, “embora os militares abominem a tortura”, “naquele momento vivíamos na guerra fria”. Porém, o grande pico ocorreu depois do término do programa, após o candidato ter afirmado que seu livro de cabeceira é de autoria de Ustra.
Quem mais mobilizou a rede nesse pico sobre Ustra foi o também candidato Guilherme Boulos:
Outros temas: Cunha, Ipiranga
Após o questionamento de Bernardo Mello Franco a Bolsonaro, aproximadamente às 22h25, sobre possível envolvimento com corrupção, diante da relação do candidato com Eduardo Cunha e outros políticos, houve uma súbita expansão do termo “cunha” no Twitter às 22h29. Momentos depois, às 22h33, o termo “ipiranga” também teve alta repercussão, após o candidato ter afirmado que o economista Paulo Guedes seria seu “posto Ipiranga”, em resposta feita por Thais Oyama por volta de 22h31.
Disputa#mulherescombolsonaro vs. #mulherescontrabolsonaro
Na última sexta-feira (27), surgiu uma disputa entre as hashtags #mulherescombolsonaro e #mulherescontrabolsonaro. A primeira alcançou o primeiro lugar nos trending topics, mobilizando 209.780 tuítes, de acordo com dados da FGV-DAPP. A segunda, por sua vez, surgiu como reação à primeira – embora muitas críticas ao candidato tenham sido feitas apenas a partir da utilização da hashtag #mulherescombolsonaro (https://twitter.com/seIengz/status/1022608323093377029/photo/1). Contudo, essa disputa não se reproduziu ontem no programa (255 – com pico entre 22h11 e 22h13, ou seja, antes do programa, e 86, respectivamente).
O gráfico abaixo mostra as manifestações com as hashtags #mulherescombolsonaro e #mulherescontrabolsonaro do dia 19 de julho, às 18h00, às 9h00 de hoje.
Notas metodológicas
Analisamos ao todo mais de 1 milhão de tuítes com os termos: “mulherescombolsonaro”,”bolsonaro”, “bolsomito”, “bolsominion”, “mito”, “direita”, “esquerda”, “PSL”, “comunismo”, “fascismo”, “fascista”, “bolsonaro2018”, “jairseacostumando”, “EuVotoBolsonaro17”, “bolsonaropresidente”, “ustra”, “mulherescontrabolsonaro”, “bolsonaronao”, “roda viva”, “rodaviva”, “bolsonarorodaviva”, “bolsonaronorodaviva”, “brasilcombolsonaro”, “corrupção”, “ustra”, “herzog”, “cunha”, “ipiranga”, “lula”, “janaína paschoal”, “bozo”, “marcos pontes”, “wikipedia”, “cristo”, “bolso”, “cotas”, “tortura” e “escravidão”.
Para o levantamento dos dados analisados, foram utilizados alguns scripts escritos na linguagem Python, além de uma tabela de um banco de dados em MySQL disponíveis no github do InternetLab. Para a configuração das redes de retuítes, utilizamos a ferramenta open source Gephi. Por fim, os gráficos foram feitos por meio da ferramenta online Google Drive, enquanto as nuvens de palavras foram construídas com o Wordart.
Equipe responsável pelo conteúdo: Lucas Lago (lucas.lago@internetlab.org.br), Mariana Valente (mariana@internetlab.org.br) e Victor Pavarin (victor.pavarin@internetlab.org.br).
Imagem em destaque: Gustavo Lima / Zeca Ribeiro / Agência Brasil, CC-BY 3.0, em Wikimedia Commons