Influenciadores, Redes Sociais e Política: a perspectiva dos jovens latino americanos

Pesquisa demonstra como a pandemia, a crise econômica e o uso das redes sociais moldam a relação dos jovens com influenciadores digitais e políticos na América Latina.

Notícias Informação e Política 10.10.2024 por Ester Borges e ⁨Paula Pécora⁩

A pesquisa “Influenciadores, jovens e política na América Latina” foi conduzida pelas pesquisadoras Camila Rocha, Esther Solano e Thais Pavez em parceria com a equipe do InternetLab. A pesquisa teve quatro objetivos: (i) saber quem são os influenciadores mais populares entre os jovens latino-americanos e (ii) quais os motivos que levam os jovens a seguir ou não os influenciadores; (iii) compreender a visão dos jovens sobre o uso que os políticos fazem das redes sociais; (iv) verificar o uso das redes e dos conteúdos dos influenciadores para formar opiniões de jovens.

Iniciada em  2023, a investigação contou com um formulário online aplicado a jovens de 16 a 24 anos em cinco países latino-americanos: Brasil, México, Argentina, Colômbia e Chile. A amostra contou com 250 questionários completos, sendo 100 do Brasil, 100 do México, 50 da Argentina, 50 da Colômbia e 50 do Chile. Os entrevistados foram recrutados segundo cotas proporcionais baseadas em idade, classe social, sexo, orientação sexual, religião e cor/aspectos étnicos, região geográfico e posicionamento político. Além disso, foram realizados minigrupos focais para aprofundar os assuntos e resultados do formulário. E entrevistas com influenciadores e especialistas na indústria do marketing de influência buscando compreender as dinâmicas existentes nos âmbitos de produção e recepção de conteúdos.

As redes sociais mais utilizadas pelos jovens e algumas tendências

Tratando-se de um geração hiperconectada a pesquisa revelou que as redes sociais utilizadas com mais frequência pelos jovens entre 16 e 24 anos são Instagram, Tik Tok, e Youtube, sendo Tik tok aquela mais utilizada para acessar informações, inclusive notícias e informações sobre política. 

Os resultados da pesquisa demonstraram ainda que há uma ampla capilaridade do ecossistema de influenciadores digitais em nichos ultra específicos.A maioria foi citada por apenas um jovem, enquanto aqueles mencionados com maior frequência (5 ou mais vezes) incluíam: 

(1) Celebridades globais do âmbito artístico ou esportivo que não se dedicam profissionalmente a serem influencers, como Leonel Messi, Cristiano Ronaldo, Shakira e Lady Gaga; 

(2) Celebridades artísticas que utilizam as redes sociais para disseminar seu trabalho, com mais de 1 milhão seguidores, mas em nível local ou regional, como os chilenos Pailita, Marcianeke, Paloma Mami e a colombiana Karol G.; 

(3) Influenciadores nativos-digitais que surgiram nas redes sociais e passaram a ser conhecidos pelos seus conteúdos associados a nichos ou segmentos específicos, como a brasileira Virgínia Fonseca, o colombiano Yefferson Cossio, o mexicano Pako Yaso e Coscu, da Argentina. Estes costumam utilizar estratégias para aproximação do público, com lives e fun meetings ou fazendo referência a comentários dos seguidores;

 (4) Políticos, especialmente aqueles que utilizam estratégias similares às dos influencers para se relacionar com seguidores, como lives, memes, danças no Tik Tok, humor e comunicação direto com eleitores ou cidadãos. Políticos de extrema-direita usam tendem a associar o uso mais intensivo das redes sociais à crítica aos grandes meios de comunicação, como Jair Bolsonaro e o presidente argentino Javier Milei.

A construção de confiança envolve a falta de intermediários

De acordo com os jovens entrevistados, a conexão entre influenciadores e seus seguidores nas redes sociais se dá pela sensação de ausência de intermediários. Isso faz com que os seguidores se sintam tratados de maneira única, criando a impressão de que realmente conhecem o influenciador, desenvolvendo sentimentos de amizade e proximidade. Para reforçar essa sensação, os influenciadores adotam várias estratégias, como falar diretamente à câmera, expor vulnerabilidades, pedir a opinião dos seguidores sobre questões pessoais e realizar interações diretas, como transmissões ao vivo e respostas a comentários. Influenciadores que têm uma trajetória “vinda de baixo” são ainda mais valorizados por seus seguidores, sendo vistos como exemplos de empreendedorismo e, muitas vezes, engajados em ações sociais e caritativas. Para os jovens, essa relação pode trazer benefícios práticos, como a descoberta de produtos, cursos e conteúdos que atendem a seus interesses.

Por outro lado, a confiança construída pode ser rapidamente abalada se os produtos ou ações recomendados pelos influenciadores forem percebidos como de baixa qualidade ou enganosos. Nesses casos, a conexão se rompe, especialmente quando o influenciador é visto como “falso” ou propagador de conteúdo prejudicial. Os seguidores, que acreditam ter o poder de sustentar ou derrubar a base de popularidade do influenciador, reagem com incentivos ou, no extremo oposto, com “hate“. Esse descontentamento pode resultar em grandes movimentos de “unfollows“, marcando uma desilusão coletiva com o influenciador.

A perspectiva de se tornar um influenciador e o impacto da Covid-19 

A pandemia de Covid-19 teve um impacto profundo na rotina dos jovens, aumentando consideravelmente o tempo dedicado ao consumo de redes sociais. Durante esse período, houve um crescimento expressivo do setor, com o TikTok emergindo como a principal plataforma e dando espaço para influenciadores desconhecidos, muitos deles vindos de classes populares. Esses novos influenciadores, com origens mais simples, conseguiram criar uma conexão mais forte com seus seguidores, fortalecendo o sentimento de proximidade e identificação. Exemplos notáveis incluem a chilena “Ropero Paula” e o colombiano Yefferson Cossio. Por outro lado, influenciadores já conhecidos tiveram que adaptar suas interações, focando em conteúdos mais locais e relacionados à vida durante a pandemia.

Esse contato intensificado com influenciadores durante a pandemia fez com que muitos jovens passassem a considerar a possibilidade de seguir essa carreira. No Brasil, por exemplo, 75% dos jovens entrevistados expressaram o desejo de se tornarem influenciadores. Diante das perspectivas negativas no mercado de trabalho, a carreira de influenciador aparece como uma alternativa atraente, oferecendo autonomia e a oportunidade de trabalhar com algo que gostam. No entanto, os jovens também reconhecem os desafios dessa escolha, como os impactos na saúde mental, a autoexploração, a alta competitividade e a incerteza sobre o futuro.

Rede social também é lugar de política! 

Embora as redes sociais sejam amplamente usadas como fonte de entretenimento, elas também se tornaram um espaço importante para o acesso a informações, notícias e discussões políticas. Entre 25% e 30% dos jovens consideram essencial discutir política nas redes para a formação de suas opiniões. Além disso, cerca de 40% dos entrevistados na Argentina, Brasil e Chile já se manifestaram publicamente nas redes sobre eleições passadas ou futuras. No entanto, o modo como as informações políticas são percebidas varia: alguns encaram com desconfiança, outros utilizam como reforço de suas próprias opiniões, e há quem simplesmente reproduza essas informações sem uma reflexão crítica.

A pesquisa também mostrou que os jovens tendem a seguir políticos que fazem uso estratégico das redes sociais, como Gustavo Petro, López Obrador, Claudia Sheinbaum, Javier Milei e Jair Bolsonaro. Esses políticos se comunicam diretamente com seus apoiadores e cidadãos, respondendo a comentários e realizando consultas online, o que transmite uma sensação de autenticidade e proximidade. Estratégias como danças no TikTok e colaborações com artistas internacionais ilustram uma nova fase no uso das redes, que pode ter um impacto profundo nas campanhas eleitorais, como observado na eleição presidencial mexicana.

No Brasil, a pesquisa destaca um cenário de fadiga política entre os jovens, consequência de uma forte polarização política e divisões familiares amplificadas por um governo de extrema-direita. Muitos jovens brasileiros evitam discutir política por medo de violência, e enxergam tanto bolsonaristas quanto lulistas como agentes dessa polarização. Ao mesmo tempo, influenciadores populares como Paulo Muzy e Virginia Fonseca promovem valores conservadores ou de empreendedorismo, moldando o discurso entre os jovens.

Nos países de língua espanhola, como Argentina, Chile, Colômbia e México, há um intercâmbio mais ativo de informações políticas entre os jovens devido à língua comum. Figuras como Nayib Bukele, presidente de El Salvador, têm ganhado destaque regional. Embora Bukele seja celebrado por suas políticas de segurança, sua postura contrária à mídia tradicional gera desconfiança entre os jovens. Na Colômbia e no México, conteúdos de esquerda são mais populares, enquanto na Argentina, Brasil e Chile há uma forte presença de influenciadores que promovem valores neoliberais e de direita.

O estudo completo está disponível em português, leia aqui!

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