A campanha digital e o impulsionamento de conteúdo pelas candidaturas à Câmara dos Deputados
O terceiro relatório do 'Você na Mira' examina o uso das ferramentas de impulsionamento de conteúdo pelas candidaturas eleitas para a Câmara dos Deputados.
No contexto das eleições 2018, o InternetLab está publicando uma série de relatórios sobre as ações de marketing digital das candidaturas, com o objetivo de trazer mais transparência para as campanhas eleitorais online. Tais estudos fazem parte do projeto Você na Mira, que permite monitorar o microdirecionamento de propaganda política no Facebook, em parceria com o WhoTargets.Me. No primeiro relatório analisamos algumas práticas de impulsionamento dos pré-candidatos à presidência no período pré-eleitoral, e no segundo relatório olhamos para as campanhas dos presidenciáveis durante o primeiro mês do período eleitoral.
Neste terceiro relatório, o foco foi no uso das ferramentas de impulsionamento de conteúdo pelas candidaturas eleitas para a Câmara dos Deputados. Além das informações sobre os anúncios políticos coletadas pela ferramenta Você na Mira, coletamos dados sobre as despesas totais de campanha e com impulsionamento de conteúdo, os votos recebidos, e o número de seguidores em redes sociais. O objetivo principal foi revelar práticas de campanha digital, analisando, principalmente, a relevância, ou não, do impulsionamento de conteúdo como estratégia digital das campanhas eleitas.
O relatório completo está disponível aqui.
Abaixo, uma seleção dos maiores destaques da pesquisa. Confira:
O rastro do dinheiro: gastos declarados com impulsionamento de conteúdo
Olhamos para as despesas contratadas declaradas por candidatas/os à Justiça Eleitoral e disponibilizados pelo portal ‘Divulgação de Candidaturas e Contas Eleitorais‘. Em regra, comparado com as despesas totais das campanhas, foi gasto muito pouco com impulsionamento de conteúdo. Em 2018, do total de despesas contratadas declaradas pelas candidaturas eleitas à Câmara dos Deputados (348.6 milhões de reais), cerca de 4.6 milhões foram declaradas sob a rubrica ‘Despesas com impulsionamento de conteúdo’, o que corresponde a apenas 1,3% do total de gastos das campanhas.
O Facebook é a principal plataforma utilizada para esse tipo de propaganda paga
A soma dos valores pagos para o próprio Facebook e para as empresas Adyen e PayU, que são intermediárias de pagamento da plataforma, chega a um total de mais de R$ 4 milhões, um valor 25 vezes maior que aquele declarado para plataforma da Google, por exemplo, que ocupa o segundo lugar, somando R$161 mil em despesas contratadas.
A nova e a velha política: a pluralidade das estratégias digitais
De modo geral, partidos mais tradicionais e incumbentes na política, tais como PT, PP, MDB, PSDB, DEM, tiveram maiores gastos de campanha e direcionaram mais recursos para impulsionamento. Esse padrão pode ser explicado pelo fato de tais legendas terem acesso a parcelas maiores do fundo partidário o que, após a proibição do financiamento empresarial de campanhas, ganhou ainda mais relevância nessas eleições. Em contraste, partidos emergentes que adotaram um discurso de renovação, como é o caso do NOVO, do PSOL, e do PSL, gastaram menos tanto no total das campanhas, como também com impulsionamento de conteúdo (abaixo da linha), mas também tinham acesso a porções menores do fundo eleitoral.
A análise das estratégias individuais de gastos de campanha das candidaturas eleitas também contribui para esse diagnóstico. De modo geral, políticos tradicionais, que são mais conhecidos pelo público, parecem ter gasto mais em suas campanhas. Como no caso dos partidos, isso pode indicar que tais candidaturas tinham acesso a uma maior proporção do fundo partidário, ou que receberam mais doações de campanha, o que possibilitou gastos altos. Além disso, é possível que campanhas da ‘velha política’ tenham apostado no uso de estratégias também mais tradicionais, já testadas e aprovadas em outras eleições, e investido proporcionalmente menos em ferramentas mais inovadoras, como o impulsionamento de conteúdo. Em contraste, as exceções que se destacam, com despesas com impulsionamento representando mais do que 20% dos gastos totais, foram algumas candidaturas que tiveram uma despesa total de campanha menor que a maioria, e cujos parlamentares foram eleitos para a Câmara dos Deputados pela primeira vez, como é o caso de Kim Kataguiri (DEM-SP), Gilson Marques (NOVO-SP), Major Vitor Hugo (PSL-GO) e Celio Studart (PV-CE).
Seguidores e eleitores: o capital social nas campanhas digitais
De forma análoga à importância do ‘capital político’ para o resultado de uma candidatura eleitoral, o alcance de conteúdos nas redes sociais não depende apenas do quanto foi investido em termos financeiros com impulsionamento, mas também no ‘capital social’ já acumulado pelas/os candidata/os e partidos. Nesse sentido, olhamos para o número de seguidores no Facebook e como esses números se relacionam com os gastos de campanha com impulsionamento de conteúdo.
Nossos dados mostram que os partidos que receberam o maior número de votos para a Câmara dos Deputados (pontos maiores) são também aqueles que ou declararam mais gastos com impulsionamento de conteúdo, ou que possuem um número maior de seguidores no Facebook. Ou seja, aqueles que organicamente ou por meio de propaganda paga tinham maior presença nas redes sociais
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A partir dos dados analisados, a pesquisa identificou que, pela ausência de investimentos significativos em impulsionamento de conteúdo, o uso dessa ferramenta não parece ter sido o elemento decisivo para o sucesso das campanhas. O rastro do dinheiro parece indicar que o sucesso de campanha digitais não depende apenas de investimento financeiro para impulsionar a circulação e a visualização do conteúdo patrocinado, mas sim que o papel da militância e o engajamento orgânico de apoiadores é relevante nas redes, assim como é nas ruas.
A vitória nas urnas de Jair Bolsonaro e de candidatos do seu partido PSL em geral é um exemplo disso. O sucesso de tais candidaturas e a dominância nas redes sociais não resultou de massivos investimentos em impulsionamento, mas provavelmente de uma campanha digital estruturada de forma mais difusa e complexa.
Acesse o relatório completo aqui.
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Equipe responsável pelo conteúdo: Beatriz Kira, Heloisa Massaro e Francisco Brito Cruz. Colaboraram Victor Pavarin e Murilo Roncolato.
Equipe do projeto: Francisco Brito Cruz, Beatriz Kira, Heloisa Massaro, Sam Jeffers e Louis Knight-Webb.
Equipe institucional: Mariana Valente e Dennys Antonialli.