Consumo de informações em apps de mensagens é feito a partir da relação com outras mídias, aponta nova pesquisa

Segunda edição de estudo sobre comportamentos e percepções do brasileiro em aplicativos de mensageria privada é lançado pelo InternetLab em parceria com a Rede Conhecimento Social.

Notícias Informação e Política 18.08.2022 por Ester Borges

Desde 2018, observa-se um crescente protagonismo dos aplicativos de mensagem em debates sobre como se dá a comunicação política na internet e como ela deve ser regulamentada, o que aponta para a necessidade de se construir uma compreensão mais aprofundada sobre a relação estabelecida entre essas plataformas e seus usuários na dinâmica de debates políticos. 

A pesquisa publicada nesta quinta-feira (18) revela que, ainda que ocupem uma posição própria na cadeia de acesso, consumo e distribuição de informação, os aplicativos de mensagem são apenas um dos fatores  nas dinâmicas de disseminação e consumo de informação. A relação que vai se estabelecendo desses aplicativos com outras mídias e plataformas (do rádio e da TV às redes sociais e mecanismos de busca) é elemento crucial para a definição de dinâmicas de circulação e consumo de informação, e para a construção de parâmetros de confiabilidade desses conteúdos por usuários e grupos sociais.

A pesquisa realizada pelo InternetLab em parceria com a Rede Conhecimento Social buscou investigar os hábitos, comportamentos e percepções de usuários de aplicativos de mensagens, como eles moldam a disseminação de conteúdo político e eleitoral e, como definem a forma como informações são recebidas por usuários nesses canais.

Assim como na primeira edição, a partir de uma pesquisa multimétodo – com grupos de discussão para coleta de dados qualitativos combinados com uma survey amostral –  o estudo traz dados quantitativos e qualitativos a respeito de como os usuários se relacionam com conteúdos e conversas político-eleitorais em aplicativos de mensagem. A pesquisa buscou mapear os hábitos e percepções do brasileiro quanto à conteúdos político-eleitorais, bem como características sociodemográficas, que juntos contribuem para a configuração de situações específicas de comunicação política nesses espaços. Colocando em foco a perspectiva do usuário, a publicação analisa os diferentes contextos de comunicação política e propaganda em aplicativos de mensagem privada, com o objetivo de jogar luz sobre o papel do usuário nessas dinâmicas. 

Regras, normas e critérios de veracidade: a “nova ética” dos grupos de WhatsApp

A pesquisa identificou a consolidação de uma tendência observada em 2020: para evitar conflitos e lidar com um sentimento geral de desgaste e animosidade, foi se consolidando uma “nova ética” para convivência em grupos de WhatsApp, com regras criadas por administradores e normas implícitas que governam como cada usuário participa nesses espaços. De acordo com os dados do estudo, 58% das pessoas dizem  estar se policiando mais em relação ao que fala nos grupos (era 40% em 2020), enquanto 64% evitam compartilhar mensagens que possam atacar valores de outras pessoas (57% em 2020) e 50% dizem evitar falar de política no grupo da família para fugir de brigas (40% em 2020). 

Mas não é apenas o medo dos conflitos e a saturação que motivam a estruturação dessa “nova ética” nos grupos. O conhecimento de termos como “desinformação” e “fake news” é difundido entre os usuários, assim como uma desconfiança prévia com relação a qualquer tipo de informação que se recebe. Dos entrevistados, 44%  consideram que grupos grandes de WhatsApp em que muitas pessoas não se conhecem têm mais boatos do que grupos pequenos em que pessoas se conhecem. Como consequência, reforçando uma tendência já identificada em 2020, observa-se que usuários buscam interagir cada vez mais só em grupos menores no aplicativo, com pessoas conhecidas e com afinidades. 

Ao mesmo tempo, na medida em que usuários se veem cada vez mais em um ambiente ameaçado pelo que chama de “fake news”, a desconfiança em relação a qualquer conteúdo cresce e vão sendo forjados uma variedade de critérios próprios para verificação e repasse de informações. Em um processo que envolve fatores como valores individuais, afinidades com crenças, ideias e outros usuários, confiança nos pares, entre outros, as pessoas vão criando suas próprias estratégias de checagem, recorrendo a fontes externas para verificar a autenticidade antes de compartilhar uma informação, mensagem política ou mesmo um link. Essa dinâmica faz com que o WhatsApp se torne um canal de distribuição de informações cuja confiabilidade é construída em outras plataformas ou relações.

Cada aplicativo uma função

De acordo com os dados da pesquisa, enquanto 99,8% dos usuários de internet utilizam o aplicativo WhatsApp, 43% são usuários do Telegram, um crescimento de 12 pontos percentuais em relação a 2020. O crescimento da penetração deste último chama atenção, assim como as novas funções que ele adquire no consumo de mídia do brasileiro. Enquanto o WhatsApp é parte do cotidiano e da manutenção de vínculos, tendo funções de telefone, intermediador de pagamentos, atendimento virtual, entre outros; o Telegram é uma ferramenta mais para acesso de conteúdos do que para comunicação, sendo utilizado muitas vezes como ferramenta de busca.

Com isso, se, por um lado, as pessoas buscam interagir em grupos cada vez menores no WhatsApp, as formas de uso do Telegram mostram uma tendência de ampliar horizontes e fortalecer comunidades, ter acesso a novos conteúdos, e interagir como pessoas “fora da bolha” que tenham interesses em comum. Essa dinâmica se reflete nos tipos de grupos que as pessoas usam em cada aplicativo. Os grupos de família, amigos e trabalho, que são os três maiores no WhatsApp, têm menos relevância no Telegram, onde grupos ligados a temas e interesses mais individuais ganham protagonismo: notícias, economia/negócios, temas de interesse, canais de políticos/artistas. Muitos desses, apesar de serem chamados de grupos, são, na verdade, canais dentro do aplicativo, em que as pessoas estão para receber conteúdos e não necessariamente para interagir.

As eleições de 2022

Há pouco menos de um ano da eleição, a pesquisa também perguntou aos entrevistados sobre conteúdos relativos às eleições de 2022. De acordo com os dados da survey (realizada em dezembro de 2021) dois em cada três respondentes afirmaram que naquele momento já tinham recebido diferentes tipos de mensagens sobre a eleição presidencial de 2022. No entanto, o volume de recebimento não se reflete no compartilhamento: 56% das pessoas afirmaram não ter compartilhado nenhum conteúdo sobre o pleito de 2022.

Já em relação à participação em grupos, 14% dos usuários do WhatsApp e 19% do Telegram afirmaram que já estavam participando de grupos de discussão política sobre as eleições de 2022. Apesar dos números não serem tão distintos entre os aplicativos, a forma de ingresso nesses grupos é: no Telegram é predominante uma postura ativa, de busca de grupos ou canais. 

Os dados e análises do estudo podem ser conferidos na segunda edição do relatório “Os Vetores da Comunicação Política em Aplicativos de Mensagens: hábitos e percepções do brasileiro”, que traz resultados da frente de pesquisa “A política em aplicativos de mensagens“, da área de Informação e Política do InternetLab, cujo foco é investigar os vetores de disseminação de conteúdo eleitoral no Brasil.

O documento está disponível para leitura em português e inglês.

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